Tempos atrás eu trabalhava
com alfabetização de adultos e testemunhei uma situação inusitada. Havia uma
alfabetizanda que demorava de chegar à sala de aula, porque tinha de percorrer
um caminho mais longo de casa até a sala de aula. Perguntada sobre a situação,
ela revelou em tom um pouco triste que era ridicularizada pelo pessoal da rua,
pois não sabia ler e escrever e estava “aprendendo as coisas da escrita muito
tarde!”.
Aquele foi um sinal sobre a
condição de não saber das pessoas adultas diante do mundo letrado.
Tempos depois assistir ao
filme Minhas tardes com Margueritte e não deu outra: a arte se
articulava com as coisas da vida cotidiana.
Minhas Tardes com
Margueritte conta a história de um homem de meia idade
que por motivos diversos não teve oportunidade de se apropriar adequadamente da
cultura letrada. Ele passa vexame entre os colegas de bairro por pronunciar
palavras fora do padrão da norma culta e desconhecer coisas da cultura erudita.
São então diversos os momentos em que ele passa por situações constrangedoras
por expressar ignorância sobre determinado assunto.
Até que um dia o homem de
meia idade encontra um idosa em uma praça e começam a conversar. Inicialmente o
assunto era sobre pombos, mas depois vai se ampliando e chega às conversas
sobre literatura.
A idosa é Margueritte. Ela
adora leitura e vai transformando o bate-papo em momentos de sedução e
encantamento. Um novo mundo se abre para aquele homem que começa um processo de
transformação, que vai da leitura de mundo à leitura da palavra.
Aos poucos, a imaginação, a
descoberta e a estima vão se entrelaçando e nasce um novo homem. Acontece então
uma pedagogia dos afetos. Ambos em estado de solidão, permitem-se conhecer o
mundo do outro e crescerem juntos.
Mas não pense os leitores
que a estima do adulto se transforma de uma hora para outra: há instantes de
hesitação do rapaz que pensa em desistir do que até então aprendera: “Era
melhor como antes – Tudo tão simples!”.
Minhas Tardes com
Margueritte é um filme que conta uma história universal,
dessa luta cotidiana que tempos quando nos sentimos inaptos diante de um mundo
rodeado de informações. É também uma narrativa que resgata valores de
solidariedade, de amor entre as pessoas e de aprendizagem pelo afeto.
Assim como não esqueci de
ter testemunhado as angustias daquela alfabetizanda, não esquecerei dos sinais
instaurados em Minhas Tardes com Margueritte: um tratado de
educação pelos afetos.
Até a próxima!
O que?
Minhas tardes com Margueritte
De onde é?
França
Quem dirigiu?
Jean Becker
Quem são os atores:
Gérard Depardieu e Gisèle Casadesus
De quando foi?
2010